Nova bipolaridade ?

A despeito da cirurgica e estratégicamente perfeita intervenção russa na Geórgia, depois de uma mal sucedida "invasão" georgiana nas regiões separatistas da Ossétia do Sul e Abkhazia, não acredito que esteja se formando uma Rússia capaz de contrabalançar a estrutura de poder do mundo de hoje.

Depois do fim da Guerra Fria, a ex-URSS tenta conduzir seus esforços no sentido de voltar ao protagonismo que até então exercia no cenário político-militar mundial. Com a alta dos preços das commodities, um investimento maciço na reestruturação de seu comércio internacional, um parque tecnológico-militar em grande avanço (com compradores em todo o mundo, como Venezuela, China, garantindo a capacidade de investimento do setor) e um presidente afeito à idéia da Grande Rússia, aquele país tem se saído bem nessa empreitada.

Mas daí afirmar que a Rússia esteja revertendo a apolaridade de poder mundial, na minha opinião, com vários atores representando certos cenários de poder, inclusive os EUA, que vem perdendo poder relativo e não soube se firmar como poder único pós Guerra Fria, é pura precipitação.

Acredito que a ordem apolar, onde a sociedade global não sofra a influência de outros países como sofrera na Guerra Fria, onde ditadores eram impostos, planos comerciais e econômicos empurrados goela abaixo, Guerras Civis financiadas e estimuladas, seja, de certa forma, uma cenário irreversível.

Explico.

Não há força motriz maior que a interdependência que existe no mundo que vivemos, onde atingimos escalas comerciais inimaginadas, fluxos de informações crescentes, fluxos financeiros, imigrações, turismo, entre outros fenômenos, que elevou a sociedade global a um patamar onde outros agentes, que não apenas os Estados, tenham força e interesses a defender. Aí incluo as ONG´s, países emergentes, fundos soberanos, culturas, as transnacionais, os bancos, organizações terroristas, partidos políticos, grandes cidades, entre outros. É a concentração de muito poder nas mãos de muitos. O poder hoje não é apenas estatal.

É, segundo os teóricos do Construtivismo nas Relações Internacionais, a construção social da política internacional, onde as idéias e normas exercem influência na formação de realidades e interesses. E afirmo, por conta própria, que interesses podem ser, sim, idéias postas e passíveis de defesa e influência da atuação estatal.

No entanto, o Construtivismo não defende que as mudanças sistêmicas, como as que estamos discutindo agora, estejam fora do alcance do Estado, como estou defendendo.

Aí parto para o argumento precípuo: atualmente, nenhum Estado conseguirá alterar o sistema que julgo ser apolar atuando como a Russía atuou, defendendo um interesse regional, contra um país frágil, desesperado por reconhecimento ocidental. Acredito que essa mudança acontecerá quando algum ator alcançar um estágio de poder capaz de mudar idéias e normas, o que é outra história.

Alcançamos um estágio de interdependência, conexão e compartilhamento tão fantásticos que só aceitaríamos a troca de influência e poder entre um estrategista militar por um burocrata afeito às normas e idéias no dia em que a consolidação das benesses da interdependência e do compartilhamente de informação forem prioridades.

Duvido que este dia esteja longe.

*Recomendo esse artigo de Richard Haass, sobre o mundo apolar, em inglês. Clique aqui.

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